1 de março de 2011

O Arquiteto Despachante


"Como podem os arquitetos projetar moradias que só eles podem entender?"


Vivemos em uma sociedade caracterizada pela competição entre grupos, que buscam sempre o favorecimento de seus próprios interesses. Em que um grupo tenta dominar outro, seja pelo poder físico, econômico ou cultural. De certa forma, esta manipulação acontece de maneira sutil e imperceptível, de modo que o grupo dominado nem perceba sua própria subordinação.
No caso dos arquitetos, ocorre uma busca constante pela dominação dentre todos os profissionais envolvidos no campo da construção. Diferenciando os arquitetos dentre engenheiros, planejadores e construtores, pela posse do bom gosto, capacitação técnica, conhecimento artístico e cultural. Sendo assim, o único profissional capacitado para a produção do espaço único, monumental e extraordinário. A questão é que este bom gosto se trata de um capital simbólico e mutável, que depende exclusivamente da imposição de conceitos desenvolvidos pelos próprios arquitetos. De modo que as edificações servem para influenciar e fabricar a ideia de bom gosto, garantindo o domínio do campo de atuação.
Os problemas dessa dominação começaram começam a surgir a partir do início do século XX, enquanto em meio a um déficit habitacional, os arquitetos passam a ter um novo panorama no modo de pensar arquitetura: a produção habitacional seriada de massa. Pior ainda quando certo arquiteto modernista defende a tese que, para possibilitar a reprodutibilidade de uma habitação extraordinária e imutável – imutável porque nada se pode acrescentar retirar ou alterar sem torna-la pior, quem deve mudar é o morador, para se reeducar e compreender a arquitetura – devemos partir do pressuposto que esta residência-tipo será habitada pro uma família-tipo com moradores-tipo. Porém é impossível que uma única planta imutável venha a satisfazer a todas as pessoas que a ela serão submetidas, ainda mais com uma reprodutibilidade em grande escala, abrangendo um numero muito maior de pessoas diferentes.
Não é tarefa fácil conferir certo valor artístico e único a um projeto padrão que deverá ser reproduzido em toda a parte, garantindo o destaque do arquiteto no contexto da construção. E a produção habitacional em série só se sustenta enquanto fundamentada em prioridades econômicas. Sendo assim, o capital simbólico dos arquitetos não pode ser aplicado às habitações em série da mesma maneira que no espaço extraordinário e monumental.
Consequência disso é que esta produção não requer a participação do arquiteto-artista e sim um arquiteto-despachante. Que deve se adaptar ao modo de produção em massa para não ser descartado pelo sistema. Desenvolvendo basicamente soluções de tarefas burocráticas.
“Tal fato ocasiona a mudança no discurso do arquiteto-artista: para ele, essa produção de edificações que não exige sua participação não pode então ser chamada de arquitetura.” (BERNIS, 2008, p.77)
O fato é que não há tantos espaços extraordinários assim a serem produzidos. De maneira que a maioria dos arquitetos terá que se submeter a outras atividades. Uma solução para encontrar o devido papel do arquiteto na produção de moradias em série é, de fato, buscar proporcionar ambientes melhores para as pessoas, deixando de lado o capital simbólico tão valorizado no campo arquitetônico, para encontrar o que realmente é o melhor para quem irá habitar a edificação.
Para tanto, é interessante um reposicionamento do arquiteto, para que haja uma aproximação entre o habitante e o arquiteto. É fundamental a criação de um espaço de dialogo constante entre arquiteto e morador, para que surja um ambiente propicio para o morador participar da concepção projetual. Por que razão não facilitar a intervenção no espaço para quem de fato o habita?
É preciso pensar um processo de projeto que de liberdade de escolha ao cliente. Conciliando individualização, qualidade arquitetônica, reprodutibilidade e considerando o caráter econômico da construção.

Referencia bibliografica: O Arquiteto Despachante - Frederico Mourão Bernis

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